Nossa História

UMA TENTATIVA DE CONTAR UMA HISTÓRIA É SEMPRE UMA TENTATIVA…

Mais da metade dos alunos de pós-graduação e dos cursos curtos do Schumacher College na Inglaterra são de fora da Europa, sendo a maioria do Brasil. Já passaram por lá mais de mil brasileiros de diversas áreas de atuação — empresas privadas, setor público, organizações sem fins lucrativos, estudantes, empreendedores etc.

Em resposta a esse crescente interesse, em 2013, Juliana Schneider e Mari Turato (ex-alunas dos mestrados), junto com membros do Schumacher College (UK) e outros brasileiros, iniciaram uma exploração do que seria possível ganhar vida no Brasil, informadas por formas mais relacionais de se entender ação no mundo, como as ciências da complexidade e a fenomenologia.

É difícil descrever o nascimento da Escola porque ele não acontece pela implementação de um plano de negócios ou com a ideia de se tornar uma representação ou filial do Schumacher College no Brasil. Justamente como essas ciências nos inspiram, ela acontece por levar a sério movimentos relacionais, às vezes muito sutis, onde há o senso de reciprocidade em direção a explorar conjuntamente um próximo passo onde há vida. Foi assim em 2013 quando em meio a conversas no College em torno do que se começou a chamar de Schumacher Worldwide (Schumacher ao redor do mundo), Juliana e Mari convidaram o diretor do Schumacher College na época, Jon Rae, e a professora e fellow, Patricia Shaw, para passarem dez dias em São Paulo, local onde reside a grande parte dos brasileiros que estudaram no College desde 1991. Esta vinda foi possível graças ao apoio de 30 mil reais do Instituto Arapyaú, valor que cobriu as despesas — de viagem, alimentação, transporte, hospedagem dos envolvidos.

Fim de semana com alumni no espaço Iniciativa Gaia, em São Francisco Xavier — outubro de 2013.

Foram encontros dos mais variados — café da manhã com alumni, almoço, jantar, fim de semana fora de São Paulo, além de encontros do acaso. Todos estes momentos seguiam abrindo espaço para que novos passos fossem sustentados, sendo que assim como em qualquer conversa — algumas seguem e outras não, ou não seguem naquele dado momento para retornarem em outro. Das conversas que seguiram, tivemos encontros subsequentes com alumni que se encontraram no restaurante GOA, de Augusto Pinto, além de praças para piqueniques, e encontros aos sábados como parte de um novo programa, o Liderança para a Transição 2014, iniciado por Juliana Schneider com a parceria de James Heffernan (RIP). A partir deste momento os encontros mensais passaram a ser sustentados, bem como conversas informais com alumni que Mari e Juliana continuavam a nutrir. Em conversa com Luiz Gabriel, Tomas de Lara, Denise curi e Claudia Mattos por exemplo, nasce a 1ª Experiência Schumacher Brasil, na Fazenda da Toca, local de um dos projetos que foram visitados com Jon e Patricia durante o período que estiveram em São Paulo, uma conexão feita pela alumni Waverli Neuberger. A Fazenda não tinha esta prática, de receber grupos, o que quase impossibilitou que a experiencia se realizasse lá, até que em um dos encontros da rede estava o alumni João Alexandre Lopes de Carvalho que sabendo da (im)possibilidade, sugeriu que parte dos participantes se hospedasse nas casas dos moradores da Fazenda, como ele — que trabalhava lá na época. Este encontro onde surgiu a ideia foi no Espaço ZYM, da alumni Claudia Mattos, apresentada à Juliana pela alumni Gisele Paulino quando foi ao Rio para reunir ex-alunos. Nesta mesma passagem pelo Rio, Juliana conheceu Carolina Bergier que lhe falou que “deveria conhecer a Rita Mendonça” e seu trabalho com a ecologia — ambas Rita e Claudia são hoje professoras da Escola com temas centrais ao que fazemos. Estes são exemplos muito concretos desta forma de trabalhar em que as conversas, e o não planejado, são um terreno levado a sério. Foi assim, conversa a conversa, encontro a encontro, que possibilidades foram tecidas até que nos reconhecêssemos como um grupo, com diferentes responsabilidades, dando vida a atividades e que passamos a chamar de Escola Schumacher Brasil.

Turma da 1ª Experiência Schumacher Brasil na Fazenda da Tocam durante ‘caminhada ao longo do tempo’.

Ao final de 2014/início de 2015, lançamos o primeiro Certificado em Ciências Holísticas e Economia para a Transição, após também vivenciar de perto um formato do mesmo título sendo realizado por alumni Schumacher em Bogotá, Colômbia. Um programa de sete meses que nasce a partir de termos vivido a semana da Experiência Schumacher Brasil, ao fim de 2014 na Fazenda da Toca, descobrindo juntos como dar vida a esse atos no Brasil. Sem uma lista de princípios, acordos ou filosofias mas sim a partir de uma apreciação atenta e detalhada aos elementos desta educação, refletindo a cada momento sob seus efeitos na prática, fizemos este ethos se recriar em terras brasileiras, um aprendizado que hoje que pertence a diversos alumni ao redor do mundo e também a muitos em diferentes lugares do Brasil.

Foi a partir da Experiência também que se dá a parceria com Livia Burani — que começa a Experiência na Toca como participante e termina como parte do movimento a sustentar essas atividades junto com Juliana (então já reconhecida como diretora) e alguns meses depois se tornando coordenadora da Escola. Junto com ela, seu marido Wago Burani vem trazer mais nutrição através do alimento ao lado de Claudia Mattos, fazendo da cozinha o coração dessa educação e através dela trazendo um resgate das nossas raízes brasileiras.

Ainda em 2015, este mesmo primeiro ano do Certificado, junto com os parceiros Ricardo Young, Izabella Ceccato e Eduardo Rombauer e a nossa mentora Patricia Shaw, nasce um programa que une o pensamento complexo e a política, reunindo pessoas de diferentes práticas para refletir uma prática política transformadora. Também criamos o nosso primeiro Conselho, na época com Pedro Leitão e Samuel Protetti.

Roda durante imersão do programa de ‘Práticas Políticas Transformadoras’ em Visconde de Mauá — outubro de 2015.

Hoje, já são mais de 800 pessoas que passaram pelos diferentes programas oferecidos sob a organização que se constituiu como Escola Schumacher Brasil, sem contar outras milhares que participaram de palestras e outros encontros mensais oferecidos ao longo destes anos. Além dos programas já mencionados, e que seguem sendo oferecidos, já foram cursos em Educação Transformadora, Fenomenologia do Design, Complexidade, Terra Viva, Empreendedorismo Vivo, além de encontros, palestras, debates, bate-papos, incluindo a vinda do fundador do Schumacher College, o indiano Satish Kumar (em 2015 e 2017).

Os temas centrais são Economia para Transição, Ecologia Profunda, Fenomenologia Goetheana, Teoria de Gaia e Ciências da Complexidade, e ganham vida através de espaços vivos como Fazenda da Toca, Fazenda Serrinha, Sítio Glória, Fazenda Ambiental Fortaleza, Rincão Gaia entre outros. E aos poucos criando encontro com outros territórios — seja no contexto da Amazônia, em periferias de São Paulo, em organizações e empresas, ou em projetos de alumni em outros países, nutrindo e despertando abordagens mais relacionais de pensar e estar no mundo, além de sustentar uma rede diversa de pessoas, aumentando conexão, colaboração e ação. Já passaram como professores convidados dos cursos: Antonio Nobre, Ana Figueiredo, Ailton Krenak, André Gravatá, Marcelo Rosenbaum, Tomas de Lara, Diogo de Moraes, Breno Strussman e Jorge Hoezel, Péo, Regina Machado, Poty Porã, Peter Web, Ricardo Young, Lara Lutzenberger e Guilherme Lito. Guilherme veio como professor convidado a primeira vez em 2016 para trabalhar a Economia de Transição junto de Mari Turato, e logo passa a ser o professor responsável pela temática.

A forma de fazer é um constante ‘se questionar’. Questionar o sentido do que fazemos, estarmos atentos ao momento que perdemos a vida e o sentido pelas formas e repetições que entram em jogo sempre que nos tornamos uma organização, por menor que esta seja. Foi desse olhar que entre 2019 e 2020, um período de transformações fortes no nosso país e também em nossas vidas, que uma pergunta se tornou muito viva: se não nos prendermos a forma que se organizou como Escola Schumacher Brasil, mas acima de tudo à vida que fez surgir essa forma, que nova forma surge? Passamos a levar esta pergunta a sério durante um ano de encontros, fazendo sentido de novos movimentos, e permitindo re-orientações em nosso trabalhar conjunto, hoje nos vendo como um coletivo de sustentação que se constitui de algumas destas pessoas que foram cruzando suas vidas com esta história e se reconhecendo em uma parceria. Alguns destes reconhecimentos surgiram ao longo da história, como do Wesley Mattos no fim de 2017 que vem dar apoio na época as atividades da Juliana e Livia, bem como outras mais recentes como o das brasileiras que estudaram o mestrado em Economia para a Transição na Inglaterra, a Flavia Bueno e Beatriz Tadema.

A parceria no Schumacher College sempre foi um apoio importante para que as atividades florescessem por aqui, e hoje seguem através de muitas iniciativas relacionadas ao Schumacher ao redor do mundo, como por exemplo a Schumacher Society. Tendo estas parcerias na periferia do que fazemos, o centro de tudo foram as relações tecidas em solo brasileiro. Inicialmente a Escola se estabelece como um negócio social sem fins lucrativos, com a ideia de eventualmente se transformar em uma ONG, o que acontece em janeiro de 2020. Essa mudança, além de estar mais alinhada à sua atuação, também vem como uma forma de expandir as possibilidades de sustentação uma vez que as atividades enfrentam desde seu início o desafio de ser auto-sustentadas. Como associação, expandimos nossa capacidade para parcerias e apoios, podendo assim ampliar as formas de participação nos cursos, trazendo mais diversidade e sendo mais inclusivos.

– escrito por Juliana Schneider sob o olhar de Mari Turato e Livia Burani.